domingo, 13 de julho de 2014

PADRE VIEIRA E O JUMENTO

PADRE VIEIRA E O JUMENTO - Comunicação e Folclore

Prof. Dr. Sebastião Breguez
breguez@uai.com.br



O jumento, um animal bíblico que desde a Antiguidade, tem servido de transporte de cargas e passageiro, estava prestes a desaparecer do Brasil. Ele foi exterminado maciçamente no Nordeste brasileiro – uma região desértica e de  muita pobreza – pelos grandes frigoríficos que utilizam  sua carne para fazer salsicha e enlatados. Mas um trabalho inteligente de Comunicação, feito pelo padre Antônio Vieira, de Fortaleza, capital do estado do Ceará, evitou que o animal foi extinto no país. O padre organizou um movimento de defesa do animal,  lançou o livro O JUMENTO, NOSSO IRMÃO para chamar a atenção das autoridades. O livro foi até traduzido para o inglês e publicado em Nova Iorque, com o título The Donkey, our Brother, tradução de Willian Teasdale, presidente de uma ong internacional que luta contra as crueldades contra os animais.
         
O jumento esteve presente, por três vezes, na vida Jesus: no nascimento, na mangedora, na fuga para o Egito, na entrada triunfal em Jerusalém, no domingo de Ramos, conforme nos conta a Bíblia. A figura do jumento tambem esta presente no Alcorão, livro sagrado do Islamismo: entre os animais que Maomé leva para o ceu esta uma jumenta. No Brasil, o jumento foi meio de transporte importante para o redescobrimento do pais pelos bandeirantes, forçando Portugal e Espanha a romper com o Tratado de Tordesilhas. Também foi elemento importante para o fim da Escravatura, pois, substituiu a forca de trabalho escrava a partir de meados do século XIX. E, por fim, o animal assumiu importância fundamental no Nordeste do Brasil como meio de transporte, como alimento e transporte de cargas pesadas. 

A população de jumentos, no Nordeste brasileiro, era de 17 milhões em 1964, passou para oito milhões em 1977, diminuiu para dois milhões em 1981 e agora está perto de um milhão. O motivo da matança era para fabricar a vacina anti-rábica, além de vender sua carne nos açougues como se fosse de boi ou mesmo para servir para fabricação de salsicha e enlatados. Daí o movimento do padre Vieira para conscientizar as pessoas da importância do jegue, que é meio de transporte muito usado ali e, principalmente, para carregar cargas.

A idade de vida de um jumento no Brasil é de 15 anos, pois é utilizado em trabalhos penosos, com excesso de carga, que esgotam suas energias vitais, enquanto que, em outros países como a Espanha, a Itália e o Egito, o jerico chega a viver de 30 a 40 anos. Além de usado de maneira inadequada, com excesso de peso e jornada de trabalho muita longa, sem a devida alimentação, o animal agora é vítima do apetite voraz de grandes frigoríficos que o matam em centenas para ter matéria-prima para seus produtos.

A publicação do livro O JUMENTO, NOSSO IRMÃO, pelo padre Antônio Vieira foi o pivô do movimento contra o extermínio do jegue. O livro foi saudado pela BBC de Londres como “o mais completo estudo até agora publicado sobre o jumento”. Com isto, o padre conseguiu criar um movimento cultural, a nível de Brasil, conhecido como “o ciclo do jumento”. Surgiram aí as músicas, literatura de cordel ( um tipo de literatura popular muito usada pelas camadas pobres da região do Nordeste brasileiro, mas de grande expressão literária ), farto material na imprensa, poesias, estudos sociológicos, econômicos e até mesmo de zootecnia. Além de motivações variadas de artesanato, festas folclóricas e até seriados de TV. O ponto culminante foi a criação do CLUBE MUNDIAL DO JUMENTO, reunindo jornalistas, professores universitários, intelectuais e cantores de renome, com repercussão até no exterior.

Com todo este movimento, as autoridades brasileiras acionaram os Serviços de Defesa Sanitária para impedir a matança indiscriminada do jegue pelos grandes frigoríficos. Só estão permitindo a utilização de jumentos inválidos... Mas a brutalidade ainda continua, a população de jegues está diminuindo. Chega-se até a quebrar as pernas do animal ou a perfurar o útero das fêmeas para mostrar ao fiscal do governo que o jumento é inválido.

O jumento hoje é mais respeitado pelo homem nordestino e ganhou até legislação trabalhista. Ele é talvez o único animal do  mundo a ter horário de trabalho definido por lei. No Nordeste brasileiro, em geral, o jegue não pode carregar cargas depois das 18 horas, ou seja, é proibido utilizar o animal para trabalhos noturnos. Também não pode trabalhar aos sábados depois do meio-dia, a ele é assegurado o repouso de fim-de-semana para recuperar as energias gastas. Se o proprietário do animal infringe a lei, toma multa e pode ser até preso. E o animal tem até aposentadoria...

Assim, hoje para quem viaja para o Nordeste – que é também uma das regiões das praias mais bonitas do país e com paisagens paradisíacas – vê-se com mais frequência jumentos pastando pelos campos ou em bandos à beira das rodovias. Foi feito documentário para a TV, que tem sido exibido com frequência nas televisões educativas da região, buscando sensibilizar o povo no trato mais humanizante do jegue, seja no trabalho como na alimentação. O objetivo é prolongar a vida do animal e aumentar a sua capacidade produtiva.  

Afinal, o jumento é um dos símbolos fundamentais da cultura nordestina. Muito contribuiu para a economia como meio de transporte doméstico, para carregar cargas e também na alimentação do homem desta região. O jumento é para o nordestino o mesmo que o camelo é para o árabe ou o beduíno do deserto. E foi salvo pela estratégia de Comunicação usada pelo padre Vieira para chamar a atenção da Opinião Pública para o problema.       

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