sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

O JORNALISMO NA ERA DIGITAL



O JORNALISMO NA ERA DIGITAL

Prof. Dr. Sebastião Breguez 

"O que chama a atenção é que o jornalismo mudou, mas as escolas de jornalismo ainda não se deram conta e ainda ensinam o jornalismo ultrapassado"

É fim-de-ano. Renova-se mais uma vez a dialética da "morte" de um ano e "nascimento" de outro. Agora com mais emoção e expectativa, pois, estamos no século XXI. É neste contexto que como professor de jornalismo avalio as mudanças do jornalismo na atualidade, principalmente, as relacionadas com o Estilo Jornalístico - a Redação Jornalística.

O Estilo Jornalístico ou a forma com que o jornalista apresenta as informações para o leitor não apareceu de repente na História do Jornalismo. Mas foi o resultado de lenta elaboração histórica que está intimamente relacionada com a evolução do próprio conceito de jornalismo. Esta História, a partir dos meados do século XIX, apresenta perfeita relação com o desenvolvimento total da sociedade. Podemos dividi-la em três fases: Jornalismo Ideológico e Opinativo, Jornalismo Informativo e Jornalismo Interpretativo.

PRIMEIRA FASE - 1900-1920 - O ESTILO OPINATIVO E IDEOLÓGICO

O que caracteriza o Estilo Jornalístico, neste período, é o excesso de adjetivismo no texto das reportagens, o uso do nariz de cera para começar a matéria, as reportagens longas e a falta de preocupação com o leitor. Também a programação visual privilegiava o texto longo com pouca imagem.

Jornalismo doutrinário e moralizador é feito com ânimo proselitista a serviço das idéias políticas e lutas ideológicas. Trata-se de imprensa pouco informativa e cheia de comentários.

SEGUNDA FASE (1920-1980)
1ª ETAPA 1920-1945 - O ESTILO INFORMATIVO E A ERA DOS MANUAIS 
2ª ETAPA 1945-1980 - A DITADURA DO LEAD IMPERA NAS REDAÇÕES

A primeira etapa da segunda fase -Jornalismo Informativo- vai se definindo a partir do fim da I Grande Guerra. Na Inglaterra e nos Estados Unidos, aparecem novas formas de redação das notícias, um novo estilo que se apoia de modo fundamental na narração ou relato de fatos e acontecimentos. O novo estilo adapta formas de expressão literária desta época para transmitir informações e notícias com eficácia e economia de palavras. Ele aparece com força e vigor que cria novas formas de expressão literária com regras próprias estabelecidas nos Manuais de Redação.

É o aparecimento da técnica do lead (guia ou orientação para o leitor) em que o jornalista anuncia no primeiro parágrafo os cinco elementos da notícias: O QUE, QUEM, QUANDO, ONDE, COMO, POR QUÊ. Este estilo chegou ao Brasil na década de 50 com os primeiros Manuais de Redação adotado por jornais como Diário Carioca e Tribuna da Imprensa. O Estilo Informativo teve, desde o seu início, três objetivos básicos em que buscava firmar-se: a naturalidade de expressões, a clareza e a concisão. É fácil imaginar-se que o aprendizado coletivo destas gerações de jornalistas (pois os Cursos de Comunicação só aparecem na década de 1960 ) em busca de maior clareza acabou cristalizando-se nesta forma peculiar de expressão literária. Também o aparecimento do Rádio foi importante. O texto para o Rádio tem que ser menor do que o para o jornal impresso para não cansar o ouvinte. Ai aparecem os quesitos para o bom texto jornalístico : clareza, concisão, densidade, exatidão, precisão, simplicidade, neutralidade, originalidade, brevidade, variedade, atração, ritmo, cor, sonoridade, detalhismo, correção e propriedade. Destes, apenas três são considerados os mais importantes: clareza, concisão e introdução que capte a atenção do leitor.

O desenvolvimento da sociedade de consumo após o fim da II Guerra após 1945 impôs novas formas de apresentação gráfica, acompanhando o desenvolvimento da tecnologia e da indústria gráfica. A concorrência com a TV, a partir de 1950, também colocou novos desafios para o jornal. Tudo teve que mudar e se adaptar às inovações, concorrência e mudanças nos hábitos de leitura do consumidor. Na década de 60 e 70, por exemplo, no Jornal do Brasil, o repórter era obrigado a usar a técnica do lead para introduzir a notícia para o leitor: "o uso do lead e da gravata eram fundamentais no JB", diz um veterano.

De 1960 a 1980, a Ditadura do Lead predominou nas redações, tolhendo, às vezes, a criatividade do repórter ao escrever sua matéria. Mas com o aparecimento das revistas semanais de informação com Veja (1968) e a chamada Imprensa Alternativa ou Nanica com O Pasquim (1969) a técnica do lead foi modificada aos poucos, cedendo à criatividade e o desafio criador dos novos jornalistas. Ai apareceu o Estilo Interpretativo.

TERCEIRA FASE - 1980 AOS NOSSOS DIAS - O ESTILO INTERPRETATIVO

O jornalismo, diante da concorrência com o Rádio e a TV, teve que mudar. Ele tem que apresentar a informação diferentemente dos veículos audiovisuais e busca mostrar –mais- detalhes ao leitor. O jornalismo aí reveste de profundidade - as reportagens longas das revistas semanais -Veja e IstoÉ , além dos jornais alternativos como Opinião, Movimento, Ex, Debate & Critica, etc- os grandes jornais mudam aos poucos seu estilo de redação formalista e tradicionalista. Aliviam o clima da Era da Ditadura do Lead, deixam o repórter usar um pouco mais de imaginação.

Já há alguns anos que os Manuais de Redação dos grandes jornais não definem o lead como resposta às perguntas O QUE, QUEM, QUANDO, ONDE, COMO , POR QUE.

Definem lead como a forma de introdução da notícia em que o jornalista apresenta o aspecto mais interessante para o leitor (veja MANUAL DA FOLHA DE S. PAULO). O uso da imagem e da cor como recurso gráfico impôs-se no novo jornalismo.

Texto curto, com adjetivos bem escolhidos para chamar a atenção do leitor e o uso de imagem (foto, ilustração, gráfico) na maioria das reportagens. Eis as novas modificações da imprensa.

O que chama a atenção é que o jornalismo mudou, mas as escolas de jornalismo ainda não se deram conta e ainda ensinam o jornalismo ultrapassado. Os velhos livros básicos como TÉCNICAS DE CODIFICAÇÃO EM JORNALISMO, de Mário Erbolato, ou IDEOLOGIA E TÉCNICA DA NOTÍCIA, de Nilson Lage, têm que ser atualizados com a nova realidade. Senão nossos alunos irão chegar ao mercado de trabalho com modelos ultrapassados e terão que reaprender tudo. Vale a pena rever o assunto e atualizar tendo como base o mercado.

FASE ATUAL - O JORNALISMO NA CIVILIZAÇÃO DIGITAL

Escassez versus opulência comunicacionalVivemos uma fase de crise - crise de energia, crise ambiental, crise econômica, crise social, crise de valores, crise de desemprego - que provoca escassez, mas vivemos, ao mesmo tempo, uma fase de opulência comunicacional. A oferta de informações ao leitor é bem maior que a demanda. Há mais informação (notícias, fotos, imagens, gráficos etc) à disposição ao leitor do que a sua necessidade e capacidade de acessar e decodificar isto tudo.É uma explosão quase atômica da sociedade da informação. A busca pela banalização de dados e informações, além de provocar o descrédito, acaba por criar uma nova crise: a apatia do leitor diante da informação. O que nos permite pensar em lixo informacional numa sociedade em busca de valores ecologicamente corretos. É mais um tema a pesquisar para futuras teses de mestrado e doutorado. Ecologia comunicacional ou informacional, eis o tema para nova área de pesquisa das Ciências da Comunicação.

Os jornais impressos estão passando por uma crise desde que explodiu a globalização nos anos 1990. Mas também em função das novas tecnologias da informação. Estamos no final da Civilização Gutemberg, que é a civilização da cultura impressa no papel. Ingressamos na Civilização Digital, no mundo cibernético em todos os sentidos.  Há até um estudo da Future Exploration Network (EUA) que prevê o fim do jornal impresso no Brasil em 2027. Claro, o jornal impresso nunca deixará de existir. Ele está se adaptando em termos de formato, apresentação visual e técnica de redação.

Alguns jornais acabaram a edição impressa com a crise como o JORNAL DO BRASIL, no Rio de Janeiro, o DIÁRIO DA TARDE, em Belo Horizonte, e outros. Os jornais, além da edição impressa, mantém a edição digital em seus portais. Ali as principais notícias são estampadas com destaque com texto curto, ilustração e imagem chamativa. Assim, com a explosão da informação on-line, todos os veículos de comunicação (jornais, rádios e TVs) mantém a edição digital. Há  também grande crescimento de portais de informação como UOL ou UAI, que apresentam resumo das principais notícias do Brasil e do Mundo, que são atualizadas varias vezes ao dia. Esta revolução da informação eletrônica enfraquece o modelo antigo e tradicional da notícia no papel acentuando a crise da civilização impressa. O mercado da informação eletrônica está em alta com grande competitividade e concorrência.  Vence quem consegue ter mais acessos e com isto maior volume de publicidade.

Em Minas Gerais, os jornais HOJE EM DIA e O TEMPO mudaram o formato: do tamanho standard para tabloide. O formato standard (cópia do modelo gráfico de jornais norte-americanos) cedeu para o modelo tabloide, característico dos jornais europeus e da América Latina. Também em MG surgiram dois novos jornais tabloides de preço baixo (R$0,25) com notícias de apelo popular - SUPER e AQUI. Eles são sucesso de vendas em Belo Horizonte e são vendidos nos sinais de trânsito. Sua receita de jornalismo: formato tabloide, texto curto, notícias sensacionalistas de crime e paixão e foto de  belas e sensuais mulheres semi-nuas na primeira página. Também mantém edição digital em seus sites.

De acordo com estudo da Future Exploration Network, centro de consultoria norte-americana, em 2027 circularia o último jornal impresso no País. Conforme o relatório, que avaliou o cenário em 20 países, a crise que levaria ao fim do jornal começaria pelos Estados Unidos. A Argentina seria a nação em que o meio terá mais resistência. O encerramento do último jornal do país é previsto para ocorrer em 2039. Para justificar a tese, a Future Exploration Network analisa uma série de aspectos. Estas previsões, entretanto, foram modificadas. Não vai haver fim do jornal impresso, mas drástica diminuição do leitor para este tipo de mídia tradicional.

No Brasil, as razões que sustentam a perda do leitor da mídia impressa são : desenvolvimento tecnológico econômico, crescimento urbano e desigualdade sócio-econômica. Pode-se citar ainda alguns fatores como como a absorção da tecnologia, o desenvolvimento da banda larga, a penetração de smartphones e tablets, a receita de publicidade no jornal, o suporte para a mídia, censura e comportamento do consumidor. O aparelho de celular incorporou as mídias tradicionais como jornal, rádio, TV e cinema, revolucionando a sociedade informacional. Na verdade, toda era de mudanças de paradigmas, leva a previsões realistas e imaginárias. O jornal impresso vai se adaptar às novas mudanças tecnológicas e culturais para se adaptar à nova realidade do leitor do século XXI e sobreviver.

No cenário mundial, devem contribuir para a diminuição da importância da notícia impressa aspectos como o aumento de custo na fabricação de e-readers, tablets e smartphones; o desenvolvimento do papel digital; a modernização de mecanismos digitais; tendências de publicidade e mudança na produção e custos do jornal. A FOLHA DE S. PAULO, que foi o jornal com maior índice de leitura no Brasil,  por exemplo, em 1990, tinha uma tiragem de um milhão de exemplares aos domingos. Hoje tem pouco mais de 300 mil. Ora a população do país hoje é de 200 milhões e 300 mil é muito pouco. O livro e a revista também estão com baixa tiragem. 


A regionalização da comunicação é uma das tendências atuais. Há uma carência por informações e notícias locais e regionais.Na Europa, muitos países já adotaram os jornais de bairro desde os anos 1960, como as rádios e emissoras de TV de bairro. Na França isto se desenvolveu muito.  As pessoas querem saber das notícias globais, mas o foco do leitor é também local e regional. É importante saber o que está acontecendo na sua  rua, na sua região, no seu bairro. Mas Hoje a tendência é diminuir o impresso. O Meio Ambiente agradece.  Para se ter o papel temos que destruir árvores. O processo de fabricação de papel envolve muita química pesada, como o ácido mercúrio, que tem forte poder de poluição. As novas tecnologias de comunicação estão institucionalizando a cultura digital. A Civilização Gutemberg que trouxe a Cultura Impressa, está em decadência. O grande sucesso mercadológico atual, em Minas gerais, é o jornal tabloide. Os jornais SUPER e AQUI vendem muito e atingem um tipo de leitor que gosta de notícias sensacionalistas, mais fotos e pouco texto. As notícias locais e regionais também são foco importante de atração de leitores.





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