segunda-feira, 14 de julho de 2014

A REPORTAGEM NO EXTERIOR



REVISTA DA COMUNICAÇÃO, Rio
A AVENTURA DA REPORTAGEM NO EXTERIOR
Prof. Dr. Sebastião Breguez
breguez@uai.com.br 

 
Trabalhar como correspondente no Exterior é um ideal que todo repórter nutre, e quando a oportunidade chega, traz um grande desafio profissional. Primeiro é preciso vencer o obstáculo da língua do país, depois tem a questão cultural e, por último, a preocupação com as fontes de informações. Tive essa oportunidade, em 1980, quando embarquei para a França. Depois de ter ocupado vários cargos na imprensa mineira — de repórter a editor —, ganhei uma bolsa para jornalistas da Fundação Rotary International e fui morar em Estrasburgo, capital da Alsácia, França germânica, sede do Parlamento Europeu, do Conselho da Europa e da Corte Européia dos Direitos do Homem.

A bolsa era para estudos e viagens nos países da Comunidade Econômica Européia, mas aproveitei para escrever dezenas de matérias para o Estado de Minas, de Belo Horizonte, e Jornal do Brasil e a recém criada EBN-Empresa Brasileira de Notícias, em Brasília, uma espécie de agencia oficial de notícias brasileira.. O prato quente eram os assuntos importantes dentro da CEE: a política econômica da Europa comunitária, as querelas na Corte Européia dos Direitos Humanos e as relações internacionais vistas segundo os europeus. A grande fonte era o Parlamento Europeu, sediado em Estrasburgo, e que tinha o Clube dos Jornalistas Parlamentares — uma reunião de jornalistas dos países europeus e asiáticos e norte-americanos. A sala de imprensa do Conselho de Europa era imponente, possuía dezenas de telex, serviço de telefoto, telefones, salas de rádio e TV. laboratório de fotografia e tudo o mais. Eram mais de 50 repórteres de jornais, rádios e TVs reunidos semanalmente nos debates políticos mais importantes. O serviço de tradução incluída versões simultâneas em quatro línguas principais como o inglês, francês, italiano e espanhol, e, às vezes, alemão.

A primeira cobertura marcante para mim foi a eleição do socialista François Miterrand à Presidência da Franca, em 1981. É que ninguém acreditava na vitória de Miterrand. nem mesmo os mais expressivos líderes da esquerda européia. Tinha feito entrevista com o Diretor do Instituto de Altos Estudos Europeus, François Dreyfus, grande especialista em política francesa, e seu prognóstico era de que o socialista perderia, principalmente na Alsácia, região conservadora onde a direita era bem instalada. Mas o resultado foi favorável a Miterrand, que se elegeu com apenas 3% de vantagem; teve que se aliar aos comunistas, em regime de coalizão, para ter maioria no Congresso francês. A visão da vitória socialista, a partir de uma região sede do gaulismo (continuadores da mesma política de Charles de Gaulle) é que foi a novidade. Houve manifestações de rua, carnaval, festas e distribuição de chopp na periferia de Estrasburgo. Como região bem germânica, a Alsácia é onde se produz a quase totalidade de cerveja e vinho branco da França.

Depois dessa aventura, recebi convite para trabalhar na Rádio Nederland, em Hilversum, capital do rádio e TV holandesa. Foi através de um contato com o jornalista Jacob Borenstein, chefe da pequena equipe brasileira lá. Precisava apenas um teste de voz para consolidar a proposta. A Rádio Nederland, assim como a BBC de Londres, queria criar um programa de jornalismo mais dinâmico, em língua portuguesa, para ser levado ao ar todas às noites para o Brasil. Deu tudo certo e fiquei lá por algum tempo em que aprendi a conhecer a Europa central. O trabalho era em equipe, com cinco pessoas, que discutiam a pauta: assuntos que poderiam interessar ao público brasileiro e, ao mesmo tempo, introjetar uma imagem positiva da Holanda, enfim, um trabalho de relações públicas via radio. Lembro-me da primeira conversa com o Diretor de Jornalismo da Rádio Nederland-. ele disse que os holandeses queriam "faturar" mais no Brasil, aumentar a fatia nos negócios e, para isso, precisavam vender a idéia de que a Holanda tinha um "way of life" interessante.

Afora o ultramoderno equipamento, o jornalismo radiofônico em Hilversum tinha pontos comuns com o praticado aqui. O som era perfeito, as salas de gravação, dotadas com as últimas novidades japonesas e americanas. As atividades cotidianas eram comuns às praticadas aqui, à exceção da língua (falava-se inglês), e, quando esbarrava em texto em holandês, recorria-se a um tradutor. Mas a Rádio Nederland mantém programas para quase todos os países do mundo em línguas variadas, como inglês, francês, alemão, espanhol, português, árabe, italiano e outras. Para o público brasileiro, eram oito programas diários, de segunda a sábado: noticiário internacional, a partir das 19h30min; Europa 81, às segundas-feiras, com esporte, espetáculos, músicas de sucesso e atualidade européia; Aqui na Holanda, às terças-feiras, com comentários sobre a vida diária na Holanda, a participação do povo na evolução da sociedade e bate-papos informais; Vitrine das Artes, arte e música clássica de maneira diferente, as quartas-feiras; Onda Curtição, novidades do mundo das comunicações e sucessos musicais na Holanda, as quintas-feiras; Giramundo, análise das relações internacionais, com ênfase para assuntos de interesse do Terceiro Mundo e Brasil, às sextas-feiras; e, nos sábados, o Correio do Ouvinte, uma espécie de encontro de ouvintes de todos os países de língua portuguesa, principalmente o Brasil. Havia ainda o Ponto de Encontro, programa em que as perguntas dos ouvintes eram respondidas, assim como os pedidos musicais eram atendidos. O trabalho era parecido com o estilo que hoje temos nos canais educativos aqui no Brasil; são programas culturais e educativos que visam a criar imagens positivas — uma espécie de comunicação institucional do governo. É o caso aqui, em Minas Gerais, da Rádio Inconfidência e da TV Minas, do governo do Estado, que estão ligadas institucionalmente a Secretaria de Estado da Cultura e fazem parte da execução da política cultural do governo. Na Holanda, cuidava do noticiário internacional e passei a editar o Giramundo,

que analisava a política internacional e suas repercussões sobre o Brasil e a América Latina. Eram 25 minutos de programa semanais, às sextas-feiras, das 20h às 20h25min. Para a elaboração do programa, era necessário ler os jornais diários (lia em inglês e francês), alem do material enviado pelas agendas. O material principal era selecionado e, depois, redigido e editado com as musicas.

Depois da experiência na Holanda, voltei para Estrasburgo (1982) para continuar o doutorado em Ciências da Comunicação e da Informação com o professor Abraham Moles, um dos grandes teóricos franceses, autor do clássico Sociodinâmica da Cultura (Ed. Perspectiva, SP) e de uma dezena de livros sobre teoria da comunicação. Trabalhei como colaborador do Dernières Nouvelles d'AIsace e depois na Rádio France Internationale (Paris), como correspondente em Estrasburgo para a seção de Língua Portuguesa. O trabalho na Rádio France era diferente; apurava as notícias no Parlamento Europeu e no Conselho da Europa, redigia e depois gravava na sala de imprensa. O material era recebido diretamente em Paris para entrar no ar, a noite, para o Brasil, no noticiário internacional. Além das questões políticas, abordavam-se também as festas populares, os costumes, o vinho branco, a cerveja e os acontecimentos.

Em Estrasburgo, os jornalistas e homens de comunicação em geral, tinham dois pontos de encontro importantes. A Sala de Imprensa do Conselho da Europa, que servia também ao Parlamento Europeu, e o Clube da Imprensa (Club de la Press de Stransbourg). Eram nesses dois locais que a gente ficava sabendo dos bastidores de tudo: da economia, da política, da cultura e dos escândalos da vida particular de um político. O Conselho da Europa, uma instituição criada em 1949 para acabar com as animosidades entre França e Alemanha, acabou congregando mais de 20 países, inclusive a Turquia, Chipre, Grécia e Malta — países fora do âmbito de ação da Comunidade Européia propriamente dita, mas ligados aos europeus por interesses comuns. O Conselho trata de cooperação técnica e cultural; (é uma espécie de UNESCO européia) e tinha, na época, 170 representantes eleitos ou designados pelos parlamentos dos países de origem — era a estrutura da Assembléia Parla-mentar. A outra parte da organização interna é o Comité dos Ministros das Relações Exteriores dos países membros. Além disso, existia o Parlamento Europeu — Órgão fiscalizador da Comunidade Econômica Européia, formado por deputados eleitos pelo sufrágio universal. Estes se reuniam duas vezes por mês em Estrasbrurgo; vinham de seus paises de origem e durante quatro dias analisavam, discutiam e votavam as principais decisões da CEE. O material jomalístico, assim, era farto; para nós, brasileiros, interessavam as decisões que podiam nos afetar e as ligadas ao Parlamento Latino-Americano, que era sediado no Brasil, em Brasília, e presidido pelo Senador Nelson Carneiro. Haviam decisões conjuntas dos Parlamentos e algumas reuniões também Nelson Carneiro esteve lá varias vezes para estas reuniões.



CLUBES DE IMPRENSA:  ENCONTRO DOS REPÓRTERES E CORRESPONDENTES

Os Clubs de la Presse (Clubes de Imprensa) são uma experiência interessante e muito útil para o jomalista  brasileiro no Exterior. Pelo menos, no. França. Eles mantém  uma organização bem parecida com a dos nossos sindicatos de jornalistas e cooperativas de jornalistas. Reúnem e congregam os jornalistas de todas as áreas, inclusive assessores de imprensa e relações-públicas. Cada  região francesa tem o seu  clube, localizado nas capitais das regiões.

Parece que o primeiro Press-Club  foi criado em Londres antes do inicio do século. A formula, então em vigor nos Estados Unidos, fez escola na Europa na década de 60 e chegou a Franca em 1975. Foi a criarão do clube de imprensa de Rennes e Bretanha, primeiro do gênero no país.

Os dez clubes existentes em 1979 na Franca foram inspirados nos seus precursores anglo-saxônicos e europeus. São  instituições (inspiradas na lei francesa de 1901, que regula as associações) que reúnem jornalistas e profissionais de comunicação. Eles têm estrutura para sediar debates, conferências, entrevistas coletivas e encontros culturais. São dotados de telex, salas de gravação para rádio e TV, e, às vezes, laboratório fotográfico. São também dotados de scotch bar, salas de leitura e biblioteca. Portanto, são um ponto de encontro natural do profissional de comunicação a serviço  no estrangeiro.

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